Artesanato de indígenas venezuelanas estará à venda em museu de São Paulo
Não é à toa que os indígenas venezuelanos da etnia warao chamam o buriti de “árvore da vida”. Nativa da Amazônia dos dois lados da fronteira, a palmeira fornece matéria-prima para uma infinidade de usos: a medula do tronco é transformada em farinha; o fruto é consumido puro, como suco ou vinho; as larvas são consideradas uma iguaria e viram manteiga com fins medicinais; a madeira é utilizada para construir pisos e telhados de casas.
As fibras do buriti também são muito bem aproveitadas: nas hábeis mãos dos warao, elas viram cestos, bolsas, vasos, redes e bandejas, entre outros objetos.
A partir desta semana, quem mora em São Paulo poderá ver de perto e até levar para casa o artesanato que resulta desse saber ancestral. Na quinta-feira (7), será inaugurada no Museu A CASA, em Pinheiros, a exposição “Ojidu- Árvore da Vida Warao”, com cerca de 200 peças feitas por indígenas venezuelanos que vivem em Roraima.
Todos os objetos estarão à venda. “Apareçam cedo para garantir sua rede, provavelmente a melhor do mundo”, recomenda meu colega Fabiano Maisonnave, correspondente da Folha em Manaus, que é dono de quatro redes warao e, por um ano, só dormiu em uma delas. Ele também é autor de reportagem do ano passado sobre as dificuldades vividas pelos indígenas para fazer seu artesanato no Brasil.
Segundo maior povo indígena da Venezuela, os warao —nome que significa “povo da água”— foram obrigados a migrar, como tantos conterrâneos, fugindo da crise em seu país. Desde 2016, cerca de 4.500 deles vieram para o Brasil, estabelecendo-se especialmente em Roraima, Amazonas, Pará, Maranhão, Piauí e Ceará.
Duas artesãs virão para São Paulo participar de um bate-papo e um workshop na sexta (8), das 15h às 17h. Marcelina Bermudez e Hermínia Nuñes vivem no abrigo indígena de Pintolândia, em Boa Vista, e fazem parte de um grupo de 33 mulheres que vivem do artesanato do buriti.
Conversei com Marcelina por telefone, antes da viagem. Ela tem 50 anos e mora no Brasil desde 2018, com quatro dos seis filhos e seis dos 11 netos. O motivo que a trouxe para cá é o mesmo que fez tantos venezuelanos deixarem tudo para trás: “Minha família estava morrendo por falta de remédios, de comida. Precisava continuar adiante, trabalhar, manter quem sobrou”, contou.
Natural do Delta Amacuro, estado venezuelano que concentra a maioria dos warao, Marcelina aprendeu a fazer artesanato com a mãe, aos oito anos. Ela explica que existe todo um processo de preparação para transformar a árvore em arte. É preciso cortar os brotos, separar as fibras, cozinhá-las, lavá-las e secá-las ao sol, para só então começar a tecer.
“Devo ao buriti tudo o que eu tenho”, diz Marcelina, que está animada para sua primeira viagem a São Paulo. “Peço a Deus que a gente se saia bem lá.”
A exposição é uma parceria do museu com a agência da ONU para refugiados (Acnur), o Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA), a ONG Fraternidade- Federação Humanitária Internacional (FFHI), a União Europeia e o governo federal.
Ojidu-Árvore da Vida Warao – Museu A CASA do Objeto Brasileiro, av. Pedroso de Morais, 1.216, Pinheiros, São Paulo, tel. 3814-9711, www.acasa.org.br. Até 20/12. Livre. Abertura qui. (7) das 19h às 22h. Bate-papo e workshop com artesãs: sex. (8), inscrições em eventos2@acasa.com.br. Grátis.